segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Feminino Sagrado



Antigamente lavávamos nossas roupas nos rios conversando com outras mulheres.Quando entrávamos na lua,entrávamos todas juntas e sentávamos na terra, doando nosso sangue sagrado e tecendo sonhos com outras mulheres. Quando tínhamos um filho no útero, ganhávamos a companhia constante de outras mulheres, compartilhando toda a arte de gerar e de dar a luz. Tecíamos, bordávamos, plantávamos, cantávamos sempre juntas.Criávamos nossos filhos juntas. Entendíamos de ervas e compartilhávamos os segredos das medicinas da terra. Quando perdemos esses hábitos nos isolamos e perdemos essa dose maravilhosa de ocitocina (hormônio do amor, fabricado também durante o parto) que fabricamos quando estamos entre mulheres. Começamos a achar normal toda essa individualidade. Começaram a nos rotular de fúteis, que gostamos de comprar, de cuidar da aparência, que falamos demais, que só falamos de homens. Esquecemos a arte de parir. Começamos a achar normal cortarem nossos úteros para dar a luz. Achamos normal também não devolver nosso sangue lunar pra terra a cada 28 dias, e usar absorventes descartáveis pra poluir nossa Mãe Terra. E como nos desconectamos da lua e da terra, e do nosso ciclo lunar começamos a achar normal tomar pilulas bombas de hormônio, porque não conhecíamos mais nosso corpo pra saber quando estávamos férteis. E ai trocamos as sagradas medicinas da Mãe Terra, por medicinas controladoras do nosso corpo. Mas algo estava gritando dentro de todas nós. Algo estava faltando. E por isso no mundo todo essas sementinhas adormecidas voltaram a brotar. Mulheres e mais mulheres voltaram a olhar pro céu, por a mão na terra, sentir e honrar seu sangue, querer parir em paz. Mulheres voltaram a querer estar com mulheres. Em volta do fogo. E em volta de seus próprios corações. E círculos de mulheres voltaram a acontecer no mundo todo...
Anna Sazanoff

sábado, 17 de janeiro de 2015

Documentário - Parto Humanizado

O Cordão Umbilical...

" Cortar o cordão logo que a criança sai do ventre materno é um ato de grande crueldade. E cujos efeitos são mal avaliados. Conservá-lo intacto enquanto pulsa transforma o nascimento.. 
.... o fato de cortar ou não, imediatamente, o cordão umbilical, muda por completo a maneira com se estabelece a respiração. E portanto, o próprio gosto da vida. Se o corte é feito logo após a saída do bebê, o cérebro será brutalmente privado de oxigênio. O sistema de alarme funciona. Todo o organismo reage. E a respiração se inicia como resposta à agressão.....
..... como ficam as coisas quando nos abstemos de intervir e conservamos o cordão? Duplamente oxigenado, o cérebro do bebê não sente em nenhum momento, falta de oxigênio. nada faz funcionar o sistema de alarde. Nem agressão, cianose, nem pânico, nem angústia. Uma passagem lenta e progressiva de um estado ao outro. "
Frederick Leboyer em Nascer Sorrindo.




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sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Violência obstétrica?


Violência obstétrica: se esse é ainda um termo novo e de difícil compreensão pra você, assista a este documentário. Ele foi produzido de maneira independente por um grupo de pesquisadoras da Universidade de São Paulo e da Universidade Federal de Santa Catarina, com a colaboração voluntária de dezenas de pessoas e se encontra livremente disponível na internet. Assista. E duvide dos propósitos de quem diz que violência obstétrica não existe e que médicos nunca são algozes e estão sempre interessados apenas no bem estar da mulher e do bebê. Com mais de 150.000 visualizações, o documentário foi premiado no Fazendo Gênero 2013, o maior congresso feminista das Américas
Assista o vídeo: 



Fonte:

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Novo consenso sobre duração do Trabalho de Parto

Então agora é oficial: o ACOG (American College of Obstetricians and Gynecologysts), equivalente à nossa FEBRASGO (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia), aderiu à curva de evolução de trabalho de parto proposta por Zhang e colaboradores desde 2002.
 Antes  dessa recomendação, o consenso internacional era seguir a curva de evolução do trabalho de parto proposta por Emmanuel Friedman, em 1952. Nada contra Friedman, que na verdade fez o que pode em sua época, mas baseou todo seu trabalho em número pequeno de mulheres americanas da época, e seria ilógico pensar que essa verdade científica fosse real até os dias de hoje. Sabemos que medicina não é uma ciência exata, e que na prática acaba sendo a ciência das verdades temporárias, uma vez que praticamente todo conhecimento se renova em 5 anos.
Mas enfim, o ACOG lançou seu consenso agora, publicado como o primeiro de uma provável série baseada na “força tarefa” chamada de “preventiva da primeira cesariana” (Safe prevention of the primary cesarean delivery. Obstetric Care Consensus No. 1. American College of Obstetricians and Gynecologists. Obstet Gynecol 2014;123:693–711). Entendam, brasileiros: em países sérios, há inúmeras iniciativas para redução da taxa de cesariana.
As tabelas do artigo mostram que a morte materna foi 4,3 vezes superior em cesarianas, e a morbidade respiratória neonatal  chegou até 4 vezes, comparadas com nascimentos por via vaginal. Ou seja, o ACOG entende que cesariana é cirurgia de emergência, que deve ter uma clara justificativa, porque aumenta morbidade tanto para mães como para seus bebês.
A famosa “distócia de progressão” ou “trabalho de parto protraído” é uma das maiores justificativas utilizadas para indicação da primeira cesariana nos EUA. Daí a necessidade de redefinição dos períodos do trabalho de parto quanto a sua duração.
Baseado na curva de Zhang, o ACOG define que, na fase ativa do TP, se houver mais de 6 cm de dilatação com membranas rotas, só devemos diagnosticar trabalho de parto protraído (que não evolui, a famosa “distócia de progressão”) se não houver mudança cervical após 4 horas de contrações efetivas, ou 6 horas de contrações ineficazes. Detalhe: a observação de 6 horas de contrações irregulares SEM USO DE OCITOCINA, QUE NÃO ESTARIA INDICADA ANTES DISSO!!!!!
Além disso, a tabela 3 do artigo salienta:
  1. A fase latente prolongada (mais de 20 horas em nulíparas e mais que 14 horas em multíparas) não deve ser uma indicação para cesariana.
  2. Trabalho de parto lento, porém  progressivo, na primeira fase não deve ser uma indicação para cesariana.
  3. Dilatação cervical de 6 cm deve ser considerada a dilatação inicial na fase ativa da maioria das mulheres em trabalho de parto. Assim, antes de 6 cm de dilatação, os padrões de progresso de fase ativa não devem ser aplicados.
  4. Cesariana por protração da fase ativa deve ser reservada para as mulheres com dilatação superior a 6 cm, com ruptura de membranas, que não conseguem progredir  após 4 horas de atividade uterina adequada, ou pelo menos 6 horas após a administração de ocitocina com atividade uterina inadequada e nenhuma mudança cervical.
  5. A duração do período expulsivo (2ª fase) é baseada em avaliações de baixo grau de evidência, portanto é sujeito a avaliações individuais, desde que não haja exaustão materna nem alteração da vitalidade fetal.
  6. Não se considera expulsivo prolongado antes de 3 horas para primíparas, e 2 horas para multíparas, considerando PUXOS ESPONTÂNEOS.
  7. O parto vaginal é recomendável para gestações gemelares com o primeiro feto em apresentação cefálica, mesmo que o segundo esteja pélvico ou transverso.
Cada vez mais surgem evidências que, na assistência ao parto, a MENOR intervenção é sempre a MELHOR conduta.
Então você, que é cuidador de parto: vamos estudar???
Um trabalho de parto fisiológico não necessita de internação antes de 6 cm de dilatação. Você deve esperar a dilatação acontecer, mesmo que ela esteja ocorrendo lentamente. Não tenha pressa em mandar a mulher fazer força antes que ela mesma manifeste esse desejo. Comece a contar o tempo de expulsivo somente após o início dos puxos espontâneos, mesmo que a dilatação do colo já seja total antes disso (aliás, você fez toque vaginal para quê, mesmo??). Monitore a ausculta cardíaca fetal a cada 15 minutos no expulsivo em mulheres de risco habitual, observando variabilidade.
Tenha tranquilidade.
NUNCA, em hipótese alguma, faça pressão fúndica uterina para o nascimento da criança (manobra de Kristeller). Isso é desnecessário e prejudicial. Se você tem pressa, vá dar uma volta, abra o notebook e leia esse consenso.
Seja um assistente de parto, e não um realizador do processo! Mulheres agradecem, e a boa ciência também.

Artigo na íntegra:http://www.acog.org/Resources_And_Publications/Obstetric_Care_Consensus_Series/Safe_Prevention_of_the_Primary_Cesarean_Delivery#table1 

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Uso excessivo de tecnologia no parto e nascimento

Eu acho que a forma mais madura de encarar o uso excessivo de tecnologia no parto e nascimento é através da compreensão das mitologias contemporâneas, elementos sub-reptícios, inconscientes e irracionais que comandam o proceder social, através do "campo simbólico" e das ideologias.
Por outro lado, dizer que os "homens" fizeram isso é ingenuidade. Dizer que eles "roubaram" (sem colocar aspas) soa violento e injusto. O masculino é representado no parto por esta atitude fálica, invasiva e intervencionista, mas bem o sabemos que não necessariamente são os homens que usam estes artifícios.
A obstetrícia foi premida pelas mitologias contemporâneas a se adaptar a uma nova forma de ver o nascimento através das lentes do organicismo. Da mesma forma, e pelas mesmas razões, a psiquiatria tornou-se uma neurociência e o amor nada mais do que uma série de arranjos hormonais que disparam elementos de contato entre os sexos visando a reprodução. Para melhor entender o humano a ciência nos reduz a seres biológicos.
O parto - e a atenção devida a ele - não ocorrem em um vácuo conceitual; pelo contrário, ele faz parte, se adapta e mantém a estrutura social e os valores a ele relacionados. Dizer que os "homens" invadiram esse território pode ser verdade, mas também invadiram em muitos outros terrenos, dos oceanos profundo ao espaço sideral, na química, na física e na medicina, por certo. Criticar a volúpia cientifista não significa desconsiderar a importância da ciência para a humanidade.
Assim sendo, mesmo que os exageros sejam agora muito evidentes, o corpo humano não poderia deixar de ser objeto da ciência.
Para as mulheres foi oferecida uma escolha: a natureza ou o saber científico, e elas se atiraram de forma inequívoca às promessas de redenção e transcendência que a abordagem científica oferecia. Quem não aceitaria?
A necessidade da humanização do nascimento parte da releitura desta escolha, pois nos parece que investimos por demais na forma e deixamos de lado o conteúdo. Perdemos a conexão com o que existe de humano em nós.
O perigo que nos ronda é a total desconexão com os intrincados e misteriosos sistemas que nos humanizam. Se a química hormonal já está nitidamente prejudicada pela invasão de drogas e "tecnologias de separação" no parto, assim também ocorre com as ligações afetivas inerentes ao processo, as quais tem a intenção precípua de nos configurar como seres formatados pela linguagem.

Escrito por Dr. Ricardo Herbert Jones